sexta-feira, 30 de abril de 2010

Sem título 2

Eu, deus,
olho para baixo, e penso:
até onde eles chegaram...
De cima, eu os vejo, e penso:
lá se vão eles - agora eles se movimentam,
agora eles entram nos caramujos que construíram,
agora eles se movem um pouco mais lentamente, têm sono,
agora eles começam a trabalhar.
Agora, alguns deles se fantasiam de paletós e gravatas.
Eles sentam em frente a máquinas que construíram
Eles dão notícias aos outros:
eles dizem o que fizeram os outros deles.
Tentam compartilhar da angústia da solidão absoluta.
Outros deles, nesse mesmo momento, e aí me preocupa mais,
Entram em cabanas que construíram para se proteger da chuva que mando,
E gozam, julgando, achando que eles são eu.
Eles sentenciam, eles enclausuram os que não se adaptaram,
Eles engaiolam os que dizem que são loucos,
Eles acham que alguma coisa, de fato, importa.
Eles não vêem como os observo, como peixes em um aquário.
Eles não vêem que até acho singelo tudo o que construíram:
eu não podia imaginar, confesso.
Eu os olhos, perplexo: nem me orgulho, e nem lamento.
Não podia imaginar que essa brincadeira duraria tanto tempo.
Não imaginava que aquilo que dei a eles, e que eles batizaram de instinto
Faria com que construíssem tantas coisas,
Faria com que pensassem que precisavam executar tarefas,
Que precisariam matar as fomes,
Que precisariam aguentar as tormentas,
Que precisavam se esconder das tempestades que mando.
O que fiz deles?
O que eles fizeram deles?
(Do que isso importa?)

Sem título

Que tipo de gente é você?
Quero saber -
dos que admiram as formiguinhas,
robôzinhos, trabalhando incessantes,
ou dos que amam os vira-latas
Trepando loucamente na esquina
No meio da rua, à luz da lua?

Que tipo de bicho é você?
Os que sabem que tudo é, na verdade
nada?
E mesmo assim, amam, sofrem, perdem
e temem a morte,
Que tomam seus porres, que vomitam suas vísceras
que choram suas águas, que riem de suas mágoas,
E que gozam, livres e inteiras.

Que tipo de nada é você?
Que vê-se tão humano, que é tão nobre,
E que se julga algo importante,
- Coitado, sem saber que é nada...
Que desfila suas tenras vitórias -
deliciosas.
E que deslizam num palco,
Caçador de plateias?
Que escolhem a dedo suas derrotas,
porque não têm derrotas,
quando só são derrotas.
Já não temem a morte?
Não mais amam a morte?

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Quase macacos

Comemos imagens constantes.
Comemos consumos.
Consumimos comidas contemporâneas,
em embalagens contemplativas:
consumimos corpos, consumimos raios azuis
contemporizamos com carroças pós-modernas
poluentes, gigantes, mas úteis à locomoção pela caça.
Consumimos novos machados de pedra.
Improvisamos nossos mercenários nomades,
E buscamos aliados feudais em bolsas de valores.
Lutamos todos os dias.
Corremos atrás da caça, como todos os outros de antes.
Guerreamos selvagemente com os que nos barram o caminho -
Uns: lutam com mais violência, ansiosos por uma porção maior do filé.
Focam incessante na caça, não olham ao redor,
contentam-se com o banquete.
Imersos em e-mails pela madrugada, nunca deixam de pensar no que caçam.
Uns, outros, pobrecitos, caçam sem tanta ânsia.
Comem as sobras que lhes deixam os outros,
Comem a sua ração escravocrata,
Mas nem dão por isso. Ou melhor,
dão por tudo, mas não lhes afeta o fato.
Ciosos de que tudo não passa do mesmo -
da luta pela caça, do sofrimento constante,
dos objetivos todos vãos.
Aqueles mesmos de seus antescedentes, quase macacos.
Tão quase macacos quanto eles próprios, contemporâneos.
Quase macacos que evoluíram,
Que constuíram estradas,
Que cortaram florestas,
Que incrementaram as carroças,
Que transformaram riscos nas pedras em números cabeados.
Tão quase macacos...

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Desejos

É hilário ver quando
Tento e quando tentas
Vender a alheios o que tenho e o que tens
Escondendo todas as tão sofridas ausências.

Que será que tem o outro?
Que deseja o outro?
Que sente o outro?
Quem será o outro.
Minha angústia constante.

Faço das minhas angústias
As células das minhas neuroses.
Tão tolas e tão bobas
Como a matéria que lhes dá subsistência.

Mas não consigo salta-las.
(Obstáculo constante:
cansam-me os atos preparatórios todos.
Entedeiam-me, impedem-me de prosseguir.
Nunca vou ao resultado).

Lambuzo-me da calda do bolo
E, tolo, não vejo e não provo nada do que está embaixo.
Nunca vou ao fundo,
Banho-me no raso, até que volto à costa.
Deito-me, canso-me e parto.

Nino as dores,
Adormecem.

Deixam-me dormir um pouco.
Até realizo alguns desejos impedidos.
Reprimidos, acorrentados, proibidos.
Ameaçam soltar-se e fugir da clausura -
Até o nascer do sol, somente.
Voltam as tocas, e de lá me esfaqueiam levemente.
Pinçam-me o interior, fazem doer um pouco,
Mas não se libertam, e nem me fazem mover.

E tudo recomeça, de novo.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Senhas da minha existência

Não sei que pensam de mim os vizinhos
Que não conheço,
com quem não cruzo nos elevadores da vida.

A beleza é que está, de fato,
Apenas nos olhos de quem vê.
Não se é feio, nem se é bonito:
É tudo só a percepção do outro.

Não existo sem o outro, realizo.
Não sou feio, não sou bonito,
não sou pobre, e nem sou rico
Sem o outro, não sou nada.

Olhares dos outros:
O que serão os seus olhares?
O que serei eu sem seus olhares?

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Palavras de um insône asmático

Respiro estranhamente:
falta-me ar, falta-me algo,
falta-me fôlego.
Num desespero comedido,
vejo-me forçado a respirar fundo,
e suave, sempre suave.
Tenho, no mais íntimo,
o pleito secreto de chorar de dor.
Mas, sempre,
falta-me fôlego,
Respiro a preservar o pouco ar que tenho.

Sinto-me um animal engarrafado.
Vejo a todos, e a mim mesmo,
Presos numa velha garrafa de vidro.
Conserva humana, bonsai mundano,
Não sei se estou vivo ou morto.
Limbo incômodo entre o conformismo e o desespero.
Os meus movimentos, limitados.
Os meus desejos, tolhidos.
Debato-me na garrafa transparente:
tento sair da jaula, mas pareço um animal,
pobre, preso,
coreografando para um público, fiel,
o meu ensaiado despero.
Gasto quase todo o meu fôlego.

Sento-me à beira da cama para respirar.
Já não tolero o calor,
Já não aguento a falta de sono,
Já não suporto os sonhos que intermedeiam os cochilos.
Mas não passo fazer nada.
Faltam-me fôlego, ar e asas.
Maldita asma.
De pouco adiantam-me os banhos,
De nada servem-me os esforços:
tudo permanece igual, e os lençois,
velhos companheiros,
testemunham o desespero insone.
As horas passam, já não sei quanto tempo me resta.
Já não sei venço as horas, ou se as perco,
fugidas por entre meus dedos,
Perdidas em meio a meus medos.
Maldito fôlego.

sábado, 9 de janeiro de 2010

...

As minhas vozes privadas,
todas elas,
constantes e ensurdecedoras,
logram emudecer
O grito dos desejos alheios.
Ouço tiros em lugar de fogos,
vejo fogos em lugar de águas.
Tomo por balas fatais
Declarações de amor,
Sensuais.

Não sei: me ouço rouco
Se expresso algum de meus desejos.
Tento ouvir a minha voz, como se de outro fosse:
soa-me infantil, soa-me imbecil, soa-me nasal demais.
Ressoo, de fatos em fatos, declarações banais.
Enxergo-me num cenário tolo,
Com outros tantos tão bobos,
Com alguns ainda mais insossos
(Questiono-me da existência da rima:
Digo, questiono-me sempre da vida).

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Espelho, Espelho meu

Gostaria de ter
Poucas, mas algumas
Dentre as certezas nenhumas
Que passeiam dentro de mim.
Nem as certezas universais
Logram me convencer.

Fico perdido em meio a um dilema:
Os que dizem "vá sem medo"
E os que me mandam "vá sem pressa".
Sinto-me às vezes dando passos incertos
(Sinto, na verdade, que todos eles são ineptos).
Vejo-me sem certeza de nada,
Percorrendo um lusco-fusco
Irritante e prolongado.
Nunca tão claro, nunca tão escuro.

Gostaria de lançar-me no incompreendido.
De sair num rompante, num rompido
Em busca de prazeres desconhecidos
(E também dos prazeres do desconhecido).
Gostaria de sair da rota,
De fechar o mapa,
De andar sem chão, mas destemido.
Gostaria de deixar que se me surgissem
As curvas e o caminho, ao longo do percurso,
Sem prevê-los, sem temê-los, sem lamentar desconhecê-los.

Gostaria, ainda, de ser melhor incompreendido.
Gostaria que tirassem a medida alheia com régua justa.
Que escolhessem a melhor delas, a mais bonita delas
Para, só então, medirem quem lhes é alheio.
Gostaria que entendessem que desconheço os códigos,
Que ignoro as linguagens sofisticadas do desejo.
Que me soubessem um boneco desajeitado, desequilibrado na vida.
Gostaria que enxergassem a tristeza do meu sorriso,
E não julgassem as lágrimas das minhas gargalhadas.
Que me olhassem, às vezes, como se mira um espelho.

Gostaria de partir para esse desconhecido, desbravador.
De não temer tanto os nãos e as perdas.
De pular para fora do meu universozinho particular
Pobre de tentativas, restrito ao território do conhecido.
De matar-me todo dia, nas noitadas da vida
E não nas lágrimas pela morte.
De virar noites sem medo do ter que dormir.
De dançar, até cansarem os pés, o que tocar.
De andar, de beber, de cair, de chorar até secar-me os peitos.
De parar de roçar riscos para lascá-los por inteiro.
De encarar o escuro da vida
Como se fosse o lindo breu dos loucos e dos artistas,
De conhecer a culpa dos permissivos.
Gostaria de arriscar na vida.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Que alguém?

Diga-me a novidade da vez
Conte-me a sua mentira de lei.
Vista-se com o seu vestido infalível,
Dessa vez, quem sabe, crível.
Nova tentativa de te enxergarem:
Mais uma expectativa ante o espelho,
Frustrada frente ao concreto de imagens alheias.
Não me diga, uma vez mais, ao que veio.
Esconda-me o sobressalto, a razão, o esteio.
Esconda-me a gastrite, o frio na barriga, o sangue nas veias.
Mostre-me, de novo, a perfeita maquiagem.
Mantenha os seus óculos escuros, cada vez maiores:
Cobrem-lhe agora, não só olhos, mas a sobrancelha
(novamente, omite-me o sobressalto).
Persista oradora de discursos pré-escritos.
Escritos, no escuro, não só à mão, mas a dedo.
Conte-me mais dos seus podres pensados,
Do seus medos não vencidos (e nem havidos).
Ande mais um pouco pelo mundo,
Com sua burca que lhe cobre os desejos.
Que pinta os medos de preto,
Que lhe esconde tudo.
Que lhe esconde toda.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Nocaute

Surra de palavras,
Que me dói a alma.
Tapas que começam sujeitos,
Passam por verbos,
Morrem em predicados.
Não são os cruéis os nãos,
Mas os porquês do não.
Murros que nascem palavras
E nocauteam-me, derrubam-me,
Tiram-me o fôlego.
Não que me leva ao chão,
E que me tira o chão.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Medo de gente

Sabe aquele perigo que se sente
Quando se se vê diante de um risco iminente,
Em frente ao golpe latente?
Sabe aquele medo louco
Que te esfria os ossos,
Que te imobiliza a mente?
E que pode ser de barata, besouro ou de um desaforo
De um gato, um cachorro, um touro, um louco...
Pois o meu é de gente.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Insone demais

Televisores acesos,
Sofás brancos,
Homens gordos
E mulheres, velhas, demais.

Insone, da varanda,
Vejo-me num futuro,
Talvez próximo demais.
É sepultura em vida:
dia-dia de mortos vivos.

Desejos anfíbios,
Nasceram sonhos
E cresceram frustrações.
Não morreram: mataram.
Mataram qualquer esperança,
Mataram toda juventude,
Viraram anos, prisões, solidões.

Tolos consolos:
Notas de dinheiro,
Doses de uísque,
Carreiras efêmeras -
E outras carreiras, longas demais.

Consciência longíqua:
(mais um consolo)
Tudo isso é vão. É universal.

A vida toda, uma cela solitária.
Banhos de sol,
Visitas íntimas com putas sofridas,
E um velho calendário,
Com dias riscados, e chorados,
À espera de uma libertação qualquer.

Pena perpétua,
Sem direito à morte.
Sua pena, seu futuro,
Tudo triste demais.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Sofistique o jogo

Eu tento escrever poemas:
brinco de prever rimas,
e mais - adoro cinema.
Reconheço as pistas falsas.
Soa óbvio quando tudo é farsa.

Só me atrai, o jogo, se for sofisticado.
Quando é óbvio demais, deixo de lado.
Sabe assim? Eu não jogo se me sinto subestimado.

Os argumentos são tão primários: falta-lhes sutileza.
Canalhas sem charme jogam sem beleza, sem destreza.
Vira tudo ironia grosseira.

Desisto, e desprezo:
Olho de longe o adversário,
E deixo que se debata, em blefes de falsário,
Sem nenhum destinatário.

Quando já conheço bem as regras,
Quando percebo as intenções ocultas,
É como se me entregassem o jogo.

E aí, eu tiro meu peão do tabuleiro,
E sequer tento o xeque.
Levanto-me do cinema:
Deixo na tela o filmezinho barato,
se não me instiga o desfecho.

E nem acendo as luzes:
Que se enganem em seus pastelões mediócres,
Que se percam em seus personagens rasos,
Que se divirtam dando textos mal-acabados.
- Enfim.
Que preencham os seus vazios com fatos inventados.

E deixo o jogo, já sem rimas,
Sem me importarem as pistas,
Um pouco irritado com a mediocridade.

- Fim prematuro da partida.
Tomo para mim a sentença de um escritor de verdade:
Ao vencedor, as batatas.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Faça todos acreditarem
Que ninguém faz o que você faz.
Todos acreditarão.
Não acredite - nunca
Que ninguém faz o que você faz.
Se descobrirem a verdade,
Quando descobrirem a verdade,
Tenho sempre um plano bê.
A verdade é dura
Para os que acreditam em mentiras.

sábado, 4 de julho de 2009

Tudo isso porque não sei se quero um dia ser feliz

Num acorde de alegria
Duma partitura triste
Olhamos aos outros e dizemos:
Ah, se eu fosse...
- Ah se eu fosse ela!
- Ah se eu fosse ele!
- Ah se eu fosse você!
E vem daí, em seguimento
Pequenos truques de felicidade.
Com a convicção de quem sabe
(quem sabe pelo fator idade)
O que é a felcicidade.
E dão-lhe dicas, E dão-me dicas
E rezam-nos a cartilha de como achar
Uma perdida feliz-idade.
Mas e se não o quero, que faço?
Será que posso apenas
Esvaziar meu corpo, acender o meu cigarro
Suavizar o corpo e dizer não à felicidade?

Encaro os seus senãos
Como se nãos fossem.
Os seus se-eu-fosse me são
Uma esmola de caridade.
Como se eu não entendesse
Que tudo aquilo que quero
É a minha felicidade.

Vendo velharias alheias
Como se fossem novidade
Para os de menor capacidade.
Sou eu também um de menor vivacidade.
Assisto sempre aos outros e seus ideais de felicidade.
Espectador da vida,
Escrevo - pretensioso - essas mesmas rimas com "ade".
Vario-me sempre sobre o mesmo tema.
Sorrio do sem-graça, aplaudo sem ver grandeza.
Tudo para você não notar que, no meio de tanta nobreza,
Há sempre o mesmo infeliz, o mesmo problema, a mesma tristeza.

sábado, 20 de junho de 2009

Eles, o belo

Aos meus perderes-de-sono,
solidões de mim, sofrimentos sem fim,
Procuro uma resposta secreta.
Não encontro uma sequer.
A pergunta sempre persiste. E busco.
O barulho de respostas quaisquer me atordoam.
Compro o silêncio:
Fumo alguns cigarros, penso num deus que não existe.
Suas respostas, artificiais demais, não convencem.
Tento dizer-me não haver resposta.
Se não aceito o que me dão, termino por aceitar que não me dêem.
Tento-me dizer que não há respostas, e que são vãs as perguntas.
E em momentos alguns de lucidez, vejo:
Esses bichos perdidos, procurando cheiros,
consagrando lugares, expressando gostares, e achares,
são o que há de belo. É o que há de concreto.
Contam-se seus estórias.
- Contem-me suas histórias!
Seus amares, e seus lares, seus olhares e suas escórias.
- Contem-me qualquer história!
Contem-me a de Jesus, contem-me de seus sofreres
digam-me de seus amores.
É o que há de belo.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Merda!

Merda! e chega.
Podem desmontar o teatro,
descer do palco,
chega desse cacete armado.
Dispam-se do figurino vencido
Tirem essas máscaras de sorrisos.
Corto a cena.
Vamos logo à sequência:
Passemos na cochia,
Lavemos o rosto,
Rasguemos a roupa.
De cara limpa,
Sorria ou chore - tire a máscara.
Agradeçamos os aplausos ignorantes
Ou as vaias merecidas e cruéis.
Desçamos do palco:
Comecemos logo a contracena da vida.

sábado, 25 de abril de 2009

Um interdito

Eu queria que fosses talvez
Que olhasses para mim talvez
Que me quisesses como te quero.
Ainda que fosse uma vez.
Mas esse talvez - que pena!
Parece-me vez nenhuma,
Quando tudo, e quando tu
Dizes-me que não há chance alguma.
Mas renego o que me dizes,
Fecho os olhos às circunstâncias todas
(E as todas são tantas, e tão infinitas)
Que me prendo a uma possibilidade remota
Como se fosse concreta
Iludo-me num quem sabe, num quiça ou num acaso
Como se estivessem tudo e todos enganados
E então me engano ainda mais,
Sonhando com um sim possível
Embora acorde - dia-a-dia - num não impassível.
(porém previsível).

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Lance pensado

Mesmo na carta de suicídio,
recorrera a clichês.
Fartou-se de obviedades:
cansava-lhe por demais o sofrimento,
como se alguém o prezasse.
Ninguém o prezava (a ele), disse.
Nem tampouco ao tormento.
Apenas a poucos é caro o momento.
Vendemo-nos barato à derrocada.
Redigira a sua morte numa só sentada.
Pura mentira.
Passara a vida insone, tramando.
Arrastou dias, desperdiçou noites.
E agora mete a bala, em ira
Não contra si, mas contra todos.
Porém não deixa rancores, afirma.
Em só mais uma linha tramada,
pensada, costurada, numa noite sem rima.

sexta-feira, 27 de março de 2009

O nome disso? (ou Mais um frevo ensaiado)

Eu só ando no escuro.
Não acendo luzes, tropeço em cruzes.
Cruzes! (sempre dizem cruzes...).
Só me encontro no velho conhecido
Perco-me - sempre - no algo desconhecido.
Esbarro no escuro.
Procuro luzes.
Termino fugindo - sempre - aos claros inimigos.
Inimigos? - perguntam-me.
Olhar o conhecido, pode ser, quem sabe
Flerte com o nunca quisto.
Até o esperado torna-se-me
Descompreendido.
Surpreendente.
Surpresa!:
O fácil de todos me é tão difícil.
Atiro no claro (algo como raro)
Acerto em muros.
Morro no escuro.