quarta-feira, 25 de junho de 2008

Caminho de Casa

Vou voltando pra casa
Levando meu carro
Empurrando meu corpo
Engolindo as secas lágrimas
Chorando uns sorrisos quaisquer.

Olho à direita e vejo
Um baba de fim-de-tarde:
Pretos e brancos
Todos tão mulatos
Posando em movimento
Sob a luz do coucher do sol
Par' um fotógrafo, um poeta
Um curioso ou um pateta.
Suam todos seus cansaços
Respondem com o suor da alma
Ao incansável mormaço.

A minha frente
Um caminho fechado por outros carros
Tantos lastros, meia-dúzia de laços
Amores, temores... vários desacatos.

Num lance qualquer de olhar
Um ebó deitado ao relento
O que será? Pra quem será?
Quem haverá despejado
Num velho prato de barro
A matéria do seu desejar?
Vejo na macumba, bunda
Vejo rumba, vejo tumba.
Qual será o desejo a pagar?

Peço licença ao santo
Equilibro entre o freio e o avante
Faço a curva, e vejo um manto
De um cavaleiro absoluto:
O mar. O mar azul, tão verde mar.
Vibra, bate e surra
Com seu salgado pranto
Um paredão de pedras cinzas
Amargas, inóspitas e imortais.
Continuará tentando, o mar
Mesmo quando eu seguir em frente
Avançar pelos poros das insensíveis rochas
Impossíveis rochas. Inacessíveis que são.

terça-feira, 24 de junho de 2008

Monotemático...

Quis me lhe dar por inteiro
Mas recusou minha oferta
Senti-me então um pateta
Das angústias, virei vezeiro.
Não havia outro senão ela.
Só havia ela, não havia outro.

Gratidão pelos versos:
Nela e por ela, minha inspiração.
Só foi isso, então?
Parece que sim, quero crer que não.
Disse-me há pouco: há você e há outro.
Entendi o recado: Não há eu. Só há outro.

sábado, 21 de junho de 2008

Recusa de migalhas

Como é querida a que se quer
Chamo-a disso em meus versos
Pois é de fato o que é.
Olho-a hoje, querida
E ainda te vejo bonita.
Mas quando me esmola migalhas
Que aprendi a digerir como banquetes
Festejados em imaginários palacetes
Refuto-as e vomito-as como farelos que são.
Eu que tive noites tantas a seu lado
Ao meu só lado, sem aparente divisão
Não me contentarei - sem chances!
Com os cumprimentos gratuitos
Em esporádicos encontros fortuitos
Que lembram a dor do perdido encanto
E o secar do antigo pranto.
Não me satisfazem a sede ou a fome
Eis porque prefiro, às esmolas jogadas,
A dor do distante e saudade do seu nome
Melhor que seja só lembrança constante.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Culpa e Medo

É tudo culpa do medo!
Meus sonhos grisalhos
Já posso chamá-los frustrações.
Meus ódios platônicos e
Os amores faraônicos
Perderam-se nos meus senões.
E se ainda sou algum desejo
Ou se te olho e almejo
Termino sempre nos mil perdões.
As desculpas são porque te vejo
Planejo e não faço, nunca ajo.
É tudo culpa do medo!

sábado, 7 de junho de 2008

Escolhas perdidas

Faça daí suas boas escolhas.
Sejam as corretas ou as péssimas,
Uma coisa eu lhe asseguro:
A perda é certa.
E tudo que for preterido já destino:
Vira um todo pretérito.
Aí você usa seu bom tino
E decide mais uma vez:
Trata-os com desprezo,
Com palavrões de despeito
Ou migalhinhas de pena.
Ou gasta suas lágrimas
Em lembranças de lamento
Faz do passado um tormento
E um amigo do sofrimento.
Mas se melhor lhe aprouver
Vire as costas para o preterido
Faça dele só um lixo
E finja, com sorridentes máscaras
Que nada disso foi doído.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Ouvindo os gênios de Irará e Juazeiro

Para ser poeta, não basta rimar.
Tem que ver nas angústias suas
Grilos desesperados que não param de falar.
Cigarras ensurdecedoras e nuas,
Que insistem nesse alto cantar.
Tem que ver riso na desgraça
E na graça, uma grande desgraça.
Há de ver mãe na solidão
E a poeira do sim
Num avalanche de não.
Tem que ver nos carecas de chapéu
E nos homens de gravata
E nos viados de batina
E nas putas de hábito
Muito mais do que a fácil censura.
Tem que ver beleza nos grilos
E riqueza na pobre usura.
Pode até ver nos prédios
Varões que disputam.
E nas ruas, fêmeas que labutam
Vaidosas, cheirosas
Sujas ou porcas.
Pode ver putas nessas belas vistosas
Ou damas em largadas rameiras
Nem um pouco vaidosas.
Pode ver nos galhos secos de árvores mortas
Os fios do cabelo da mais bela menina.
Mas parece essencial
Não deixar que se lance cimento em cima.
Tem que rolar na cama
Sem cobrir-se de lençóis
Ou esconder-se em caracóis.
Também não vale proteger-se em cachecóis.
Tem que honrar em cada verso, ou em cada nota
O fardo e o presente que lhe foi dado:
Essas idéias que borbulham numa cabeça poliglota.